WALTER SCOTT













WALTER SCOTT
O Talismã
(Editora: Romano Torres)

O AUTOR
Walter Scott nasceu em Edimburgo em 1771, na Esócia, e faleceu em 21 de setembro de 1832 na cidade de Abbotsford, daquela mesma nação, aos 61 anos. Génio literário precoce, aos vinte e dois anos já era considerado o primeiro poeta nacional da Escócia. Contudo, ia ser no romance histórico, de que é o grande iniciador, que ele se ia distinguir. O pai tinha-lhe destinado a carreira jurídica, mas os seus dotes literários e a sua paixão pela escrita vieram-no a impor como escritor. Em criança foi vítima de poliomielite, resultando dessa doença ter ficado um pouco coxo. Durante algum tempo foi criado por uma tia, que incutiu nele o gosto pela tradição oral. Era um homem amante da História, um tanto conservador, mas tolerante e contra a violência. Os escoceses são ufanos dele, mapeando com o seu nome as ruas e avenidas do seu país, e levantando-lhe grandes monumentos. Esta influência estende-se também aos Estados Unidos da América, à Austrália e Nova Zelândia. 


A OBRA
A obra de Walter Scott estende-se ao romance histórico, à poesia, aos contos, para além de incluir muitos outros trabalhos de menor expressão, mas grande interesse cultural. Muitas das suas obras são mundialmente conhecidas, como Ivanhoe, Rob Roy, A Dama do Lago. Foi o primeiro autor britânico a internacionalizar-se pela escrita. Soube inspirar-se no povo, recolher as tradições orais do seu país, valorizar a história e a tradição sem deixar de ser inovador. É, de facto, o grande iniciador do romance histórico, com uma influência determinante na literatura ocidental.

O ROMANCE HISTÓRICO
Livros narrando grandes aventuras históricas, grandes epopeias, já o haviam precedido. A Ilídia e a Odisseia de Homero e a Eneida de Virgílio são seus precursores, bem como as novelas de cavalaria da Idade Média, em que se incluiu o ciclo do Rei Artur, do Santo Graal, de Carlos Magno, de Amadis de Gaula, do Cid, mas num estilo muito mais enfático, perdidos em mitologias, afastados do rigor histórico, sobretudo narrativos. Foi ele que, quando a população europeia estava predisposta a ler e tinha uma sensibilidade romântica, se inspirou a escrever neste novo modelo, levando à afirmação e expansão do género, que depois se complexificou. Soube dramatizar a História através da exposição do tema, desenvolvimento da crise, até ao seu final consolador. Na segunda metade do século XIX, com a introdução do realismo, os seus livros perderam algum interesse para as gerações mais velhas, mas continuaram a ser lidos pelos jovens, e ainda hoje dão material para filmes. O romance histórico, apesar de abalado pelo aparecimento de novas correntes literárias, vem recuperando a sua afirmação, agora em novos moldes, explorando os temas nebulosos do passado, dando vida aos seus períodos mais conturbados, ou a figuras históricas marcantes, sob as quais pende alguma curiosidade.  
 
 

O TALISMÃ
Já no fim da terceira cruzada à Terra Santa, por volta de 1192, durante uma trégua, Sir Kenneth do Leopardo, Príncipe da Escócia, defronta na Síria um cavaleiro muçulmano, de nome Ilderim Sheerkohf Emir, a quem após um recontro estabelece diálogo. Prosseguindo a jornada, acaba por entrar num convento, onde vive o eremita Engaddi e se depara com Lady Edith Plantageneta, por quem fica enamorado. Finalmente chega aos acampamentos dos cristãos, onde estão acantonados Ricardo Coração de Leão de Inglaterra, Filipe II de França e o Arquiduque Leopoldo V de Áustria. Os três estão muito divididos, reclamando cada um para si a honra de conquistar Jerusalém. Fazem parte do conselho da liga cristã, juntamente com Jóscius, arcebispo de Tiro; Robert de Sablé, Grão-Mestre dos Templários; e o Marquês Conrade de Montserrate. Do lado dos muçulmanos lado dos muçulmanos está o sultão Saladino, que chega a entrar no acampamento inglês como El Hakim, disfarçado de médico mouro, quando Ricardo adoeceu.
Há outras personagens importantes, embora secundárias, como Strauchan, escudeiro de Kenneth; a Rainha Berengária, mulher de Ricardo; Lady Calista, sua assistente; Necbatus, anão da rainda; Wallenrode um guerreiro Húngaro; Blondel, menestrel de Ricardo; Marabu, um fanático turco; Sir Thomas de Vaux e Sir Thomas de Multon. Com estas indicações talvez seja mais fácil ler o livro.
O romance explora o amor entre Kenneth e Lady Edith, ainda prima do rei Ricardo de Inglaterra, paixão que vai ter no desenrolar do livro alguns percalços. O jogo político trava-se sobretudo entre Ricardo de Inglaterra, Leopoldo de Áustria e Filipe de França, com o Grão-Mestre dos Templários e o Marquês de Monteserrat de permeio, tendo como contraponto, mas aparentemente ausente, a não ser ao fim, o sultão Saladino. Para um medievalista será sempre um livro muito interessante.
            O romance é de início nebuloso, descritivo, mas depois vai-se aclarando, com diálogos mais calorosos e frequentes. A linguagem é quase solene, por vezes bíblica. Retrata o choque entre duas religiões, dois modos de viver, dois climas. O talismã propriamente dito vai ser uma punção de Saladino, que este usara para curar Ricardo. A intriga, a traição, o jogo amoroso, os actos de valentia, o espírito de aventura, a honra, os ideais de cavalaria são ingredientes presentes por todo o livro, o qual, para além da sua componente de entretenimento tem grande valor pedagógico. Isto, apesar de nem sempre seguir com rigor as fontes da História. A personagem Lady Edith, por exemplo é fictícia, foi inventada como artifício para dar um tomo romanesco ao livro.

CONCLUSÃO
O Talismã é um romance que ainda se lê com muito agrado. Ressalvadas as perdas na tradução que possa ter, não será uma obra que se distinga pela excelência da sua elaboração romanesca, já que este género era então embrionário. Contudo, consegue traduzir bem o ambiente aventuroso das cruzadas, delinear com mestria o jogo político da Liga, descrevendo as intrigas militares e políticas, não sem que desenvolva em simultâneo e com alguma intensidade a intriga amorosa, impregnada de ingredientes que mais tarde outros autores tanto recorreram: como a paixão, o segredo, o mistério, a traição: efeitos capazes de atrair muitos leitores.
Hoje alguns críticos poderão não gostar do seu processo narrativo por ter pouca explicação psicológica, ser algumas vezes descritivo e demasiado solene, teatral, e noutras ir por se perder por longos diálogos, precisos mas excessivos, sobrevalorizando a acção, a aventura, o misticismo. Porém, sejamos justos, O Talismã é um livro com uma contenção e uma delicadeza quase salomónicas, na altura, excitante e inovador, bem dentro da história da literatura ocidental. E não fosse ele tão longe nestes aspectos, que nos dá um relance mais ou menos fiel e bastante vivo de uma página da História do Mundo.  

6.10.2013
Martz Inura



Nenhum comentário:

Postar um comentário