J. M. COETZEE
O Homem Lento
Tradução de J. Teixeira de Aguilhar
DOM QUIXOTE
O
HOMEM
John Maxwel Coetzee nasceu na cidade do Cabo, em 9
de Fevereiro de 1940. Frequentou ali no secundário a escola católica dos Irmãos
Maristas, e tirou na Universidade os bacharelatos em Inglês e Matemática. De 1962
a 1965 trabalhou na Inglaterra na programação de computadores, mas já aí
estudava uma tese sobre Ford Madox Ford. Em 1963 casou-se com Phillipa Jubbert, de que tem um
filho e uma filha. Em 1965 vai para Os Estados Unidos da América, onde em
Austin, na Universidade do Texas, obtêm um doutoramento em Inglês e Línguas
Germânicas com uma tese sobre Samuel Beckett. Ensinou posteriormente na Universidade
Estadual de Nova Iorque de Buffalo, e nas Universidades de Johns
Hopkins, Harvard, Stanford e Universidade de Chicago. Ele tinha tido alguma ligação
com quem nos Estados Unidos naquela época eram contra a Guerra do
Vietname, e como não lhe dessem o visto de permanência permanente naquele país,
em 1971 regressa à África do Sul, onde irá ser professor na cidade do Cabo. Em
2002 emigrou para a Austrália, onde exerce um cargo honorário na Universidade
de Adelaide. Recebeu vários prémios literários, duas vezes o Booker Prize: em 1983 com A Vida e O tempo de Michael K, e em 1999
com A Desgraça., e o Prémio Nobel de Literatura em 2004.
J.
Coetzze está sobrepujado de mais de uma dezena de prémios, não é lugar para os
citar aqui a todos, mas podemos ainda citar o Prémio Femina (França – 1985), o
Prémio Jerusalém (1987), e até um do Primeiro-ministro da Austrália. Isto que
não sirva para denegrir o valor incontestável do autor, que é um tanto avesso a
prémios, houve um, na Inglaterra, que nem o foi receber, tem um compromisso com
a literatura, não a subordinando à ideologia. Não é pretensioso, ele sofreu muito com a morte do filho
Nicolas e da esposa, Phillipa, sabe bem como nestas situações, toda a grandeza destes
prémios é insuficiente. Contudo, será bom fazer uma análise sobre a
relatividade da atribuição destes prémios, dando contorno político ao que devia ser literário, e lamentar a injustiça que coube a
outros grande autores, que morreram ignorados. É bem visível nestas atribuições
a influência das suas ideias políticas (Luta Anti-Apartheid e contra a Guerra no Vietname, denúncia do estupro feminino e crítica da censura); das instituições
culturais, como são as Universidades (Cabo, Texas, Buffalo, Hopkins, Harvard,
Adelaide); da Língua Inglesa, das mais difundidas do mundo; dos apoios vindo de
vários países que lhe estão afectos (África do Sul, Inglaterra, Holanda, Estados
Unidos Austrália, Irlanda e Israel). Um autor depois de muito premiado, os
prémios que a seguir receba são sobretudo para engrandecer as instituições que
os atribuem.
A
OBRA
O autor publicou mais de uma vintena
de livros, que vão do romance ao ensaio, à crítica literária, destacam-se aqui os
seguintes:
- Dusklands (1974)
- No Coração desta Terra (1977)
- À Espera dos Bárbaros (1980)
- A Vida e Tempo de Michael K (1983)
- A Idade do Ferro (1990)
- O Mestre de São Petersburgo (1994)
- Desgraça (1999)
- Elisabeth Costello (2003)
- O Homem Lento (2005)
- Diário de Um Ano Mau (2007)
- A Infância de Jesus (2013)
O
ROMANCE O HOMEM LENTO
Breve resumo sobre o enredo
O romance relata a vida de um fotógrafo
que tem um acidente de bicicleta, de que resulta a amputação de uma
perna. Já sexagenário, regressa a casa inconformado, não quer usar prótese e
anda de canadianas. Porém, sente-se limitado, é um homem solitário e defronta-se com a necessidade de
depender dos outros. Tem de arranjar quem o apoie, e, vivendo com algum
desafogo, contrata a enfermeira Marijana, por quem ao fim de algum tempo se
sente apaixonado. Tenta ajudar o filho dela, arranja-lhe uma bolsa de estudos,
mas ao marido esta situação de proximidade com a sua família não lhe agrada. Eis
então que faz uma amizade com Elisabeth, uma escritora misteriosa que lhe vem
complicar esta relação, e o exorta a lutar pela vida, a acreditar mais em si e
viver em plenitude.
Principais Personagens
- Paul Rayment, a personagem principal. É um homem amargo, divorciado
e sem filhos, desligado da vida, que sofreu um acidente e perdeu uma perna
- Marijana, enfermeira croata, mulher casada, com três filhos, que já
passou por muitas dificuldades e o vai tratar, e não é pessoas que se deixe
facilmente iludir
- Elisabeth Costello, escritora que aparece na vida de Rayment, meia
cega mas lúcida, que funciona como o seu Alter-Ego, algo artificial, recurso
para o encorajar a viver
- Drago, filho de Marijana, por quem Rayment simpatiza
- Miroslav Jokic, marido de Marijana
Comentário geral
J
Coetzee escreve com quem conta uma história,
procurando tirar à narrativa qualquer carga livresca que tenha. Com austeridade
mas rigor analítico, não se coíbe de descrever os aspectos mais triviais da
vida, que, sendo na sua aparência superficiais, servem para melhor explicar
este tempo, sem recorrer a grandes arroubos de Psicologia ou Filosofia. Ele
parece dar luz à ideia de que as coisas mais complexas se fazem das coisas mais
simples, que a Natureza, despretensiosa e modesta, não precisa de fazer milagres,
para, como que dormitando, estar sempre à frente da ciência dos nossos sábios,
freneticamente despertos. O autor parece partir deste pressuposto, chega a um locus literário e foca a luz da sua
criatividade sobre as personagens que o habitam, pondo a descoberto as suas
preocupações, as suas aspirações, os seus receios, não dramatiza demasiado as
coisas, ele tenta recriar a vida tal como ela é.
Faz
uma narrativa na terceira pessoa, para se distanciar mais da realidade, e esta
se torne transparente para o leitor. Usa uma linguagem simples e concisa, que
alguns acusam de minimalista, mas que nos parece precisa, apenas não a seduz os
exageros da retórica. E, ainda que não se pretenda envolver em grandes
lucubrações filosóficas, ele não se escusa de impregnar as situações de um
elevado sentido ético –, o bem e do
mal surgem por vezes tão em relevo que parece que estamos a entrar num ensaio. Mas
tenha-se em atenção, que as suas personagens nem sempre se norteiam pela moral
judaico-cristã. No livro, quando Rayment tenta ajudar o filho de Marijana julga
estar a fazer o bem, mas já o mesmo não pensa o marido dela, que desconfia que
ele está a querer-lhe a roubar-lhe o filho e a mulher, a destruir a sua família.
Por outro lado até que ponto será eticamente aceitável ele estar a meter-se com
uma mulher casada já com três filhos?
O
estilo deste autor é leve e delicado, provido de um fio condutor coerente, sem
hiatos. Ele serve-se desta abordagem directa para se aproximar da vida, construindo,
como dizem alguns dos seus críticos, um realismo
comprometido com o seu tempo. Porém, não o faz gratuitamente, ele não é alheio a
uma forma subtil de subversão da realidade, a que o leitor não pode ficar
indiferente, quando vê as suas personagens desembocarem em becos aparentemente
sem saída. O Homem Lento é um livro inconclusivo,
o leitor vê as personagens a esvanecerem-se por entre a bruma de decisões
prementes, emersos num mundo contingente, onde predomina o princípio da
incerteza, em que somos confrontados com uma realidade tão complexa quão
absurda, que temos de repensar para lhe dar sentido.
Uma
das grandes virtudes deste romance é pôr em questão a situação da velhice, que,
sentindo-se cada vez mais fragilizada, vê a morte a aproximar-se; e também os enfermos
e os incapacitados, filhos de um Deus menor. Ele equaciona os problemas, e predispõe-nos
a encará-los com naturalidade. O ser humano, mesmo na plenitude das suas faculdades
é sempre muito limitado, e tem de adaptar-se às circunstâncias. Ele não corre
como as chitas, não nada como o peixes, não voa como as aves. Aquele homem já
não é o homem-foguete, tornou-se lento, apenas isso, não perdeu a sua
dignidade, há que encarar as dificuldades da vida e não perder a esperança. Ele terá de reaprender a
viver com as suas limitações. Note-se que foi no amor que ele encontrou uma
tábua de salvação para se agarrar mais à vida. Mas terá de ser ele a escolher o
seu destino. É um romance simples mas cheio de humanidade.
9/11/2017
Martz Inura
Vcirescriba Eric Crossley https://wakelet.com/wake/sYlwt0yuE_4uCRk6w3a5G
ResponderExcluirthistnutcwortsu