PEARL S. BUCK





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PEARL S. BUCK
A Mãe
Tradução de Isabel Risques
Publicações Dom Quixote (2018)

A MULHER
            Pearl Sydensticker Buck, nasceu em Hilsbboro, a 26 de junho de 1892, no estado norte-americano de Virgínia Ocidental, e faleceu a 6 de março de 1973, em Danby, no estado de Vermont. Nascida numa família de missionários presbiterianos, aos três anos foi levada para Xangai, onde aprendeu chinês e recebeu noções sobre o confucionismo. Em 1910 regressou à América para tirar um curso de Psicologia. Voltou à China para assumir ali funções letivas na universidade. Casou e teve uma primeira filha deficiente mental. Viveu ali até à guerra civil. Em 1934 regressaria à América, nunca mais voltando à China, por não lhe darem o visto de entrada. Foi mestra de literatura na Universidade de Cornell. Era uma escritora prolífica, escreveu mais de 110 livros e várias novelas para a Rádio. Teve um filho e uma filha, casou duas vezes. De o seu livro A Flor Escondida tirou-se o libreto para a Ópera Madame Butterfly de Puccini. Esteve ligada a causas sociais pela igualdade; pela libertação da mulher e ao auxílio à China, cuja imagem clarificou para o Ocidente. Só mais recentemente a sua obra foi finalmente publicada naquele país, que criou na sua antiga residência, perto de Xangai, um museu em sua homenagem. Em 1932, com A Boa Terra (Terra Bendita) ganhou o Prémio Pulitzer de ficção, e em 1939 o Prémio Nobel de Literatura. Alguns dos seus livros foram adaptados ao cinema.


A OBRA
            A obra de Pearl S. Buck é imensa e variada, mais de duzentas publicações, dispersas por romances, biografias, contos, ensaios, peças dramatúrgicas. A sua relação completa consta por aí nas suas biografias. Destacam aqui apenas alguns romances, doze, que poderá começar a ler:
  Vento Oriental Vento Oeste (1930)
              Terra Bendita (Terra Abençoada) (1931)
              Os Filhos de Wang Lung 1932)
              A Mãe (1933)
              O Patriota (1939)
  A Semente do Dragão (1942)
              O Pavilhão de Mulheres (1946)
  Peónia (1948)
              A Flor Oculta (1952)
              A Mulher Imperial (1956)
              Mandala (1970)
              A Eterna Demanda (2013) (póstumo)

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Antiga residência de Pearl S. Buck em Zhenjiang, perto de Xangai 

O ROMANCE, A Mãe

  PERSONAGENS PRINCIPAIS

A Mãe: É a principal personagem do romance. Nunca é nomeada. É casada, tem dois filhos e uma filha cega. O marido abandonou-a, mas ela simula para todos ele estar presente, na esperança que ele um dia regresse. Perdê-lo era uma desonra para ela. Sozinha, tenta manter a família unida, trabalhando arduamente, sem um queixume, sem um desfalecimento. É forte e corajosa, representa o papel desigual da mulher camponesa da China daqueles tempos.
O Marido: Um homem pouco responsável, que acusa a mulher de ser uma parideira. Não quer saber da educação dos filhos. Trabalha pouco e dedica parte do seu tempo ao jogo, em que costuma ganhar. Compra um tecido azul para a mulher lhe fazer uma veste nova e desaparece para sempre.
A Sogra: A mãe do marido, já velha, que ela ficou a tratar até à morte, e com que se dá mais ou menos bem. A senhora tem a esperança que o filho um dia regresse a casa, mas vai morrer sem o voltar a ver.
O Filho mais velho: Como herdeiro natural, vai-se assumir o papel de dono da casa a partir do seu casamento. Tem ciúmes do irmão mais novo, que trata de modo austero. A mãe arranja-lhe uma mulher mais velha cinco anos do que ele. Como era costume, e adapta-se a ela.
A Filha cega: A menina que tratava do lume no meio do fumo, e que ficou cega. É paciente e aceita a sua condição de cega. A mãe preocupa-se com ela, por fim arranja-lhe um marido, que uma alcoviteira lhe indicou como razoável. É levada para lá e lá morre, de tristezas e maus tratos.
O Filho mais novo: Parecido com o pai, a quem a mãe protege. É maltratado pelo irmão mais velho. Mais tarde desaparece, e quando dão com ele está preso pelas forças governamentais por ser um rebelde comunista. Vai ser decapitado. Morre a cantar os hinos revolucionários.
A Nora: A mulher que a Mãe arranjou para o filho mais velho. Não é muito bonita, mas é forte e sabe costurar. É independente, e a Mãe não gosta de tudo o que ela faz, mas o filho aceita-a tal como ela é. 
O Primo: Um homem calmo e generoso, que às vezes apoia a prima, em situações onde um marido o devia fazer. É casado e acusam-no de ser lento a pensar, mas ele será mais ponderado que estúpido.
A Prima: A esposa do Primo: Uma mulher que vive os problemas da família daquele tempo, é compreensiva com a Prima, que ajuda em circunstâncias especiais.
A Alcoviteira: É uma mulher que está a par do que se passa na aldeia e é intermediária de casamentos, fazendo ali o seu papel


            – BREVE RESUMO
Capítulo 1
            O romance passa-se na China, no meio rural, por volta de 1920. Uma família vive numa casa coberta de colmo, numa aldeola de seis ou sete casas. A mãe está velha, passa a maior parte no tempo numa cadeira de bambu. O filho trabalha no campo no cultivo do arroz, a mulher, que vai ser no romance a Mãe, ajuda-o no que pode e dá-lhe filhos. 
Capítulo 2
            A Mãe levanta-se de madrugada, solta as galinhas, põe cá fora o búfalo, varre o pátio. Foi à lareira acendeu o lume e aqueceu água para o marido e a sogra se servirem quando acordasse. Viu que a filha sofria das vistas e tentou arranjar um bálsamo, mas era caro e a sogra disse que quando era nova também era assim e depois melhorara. A sogra usava agora um vestido vermelho que considerava a mortalha para quando morresse.
Capítulo 3
            Chegou a época da floração dos feijoeiros, agradável de se ver e cheirar. Não havia ali parteiras, a mulheres ajudavam-se umas às outras nestas lides. A Mãe e a Prima estão grávidas, sabem o que isso custa, e vão ajudar-se uma à outra. O Marido não está nada satisfeito com aquele filho que ali vem. A Sogra diz, inocentemente, que dera à luz nove filhos, todos crianças fortes e saudáveis até morrerem.
Capítulo 4
            O Marido era a pessoa mais importante da casa, ocupara o quarto do pai e remetera a mãe para uma enxerga. Costuma ir jogar à noite. Para ele, os filhos eram o diabo. Usava um anel banhado de ouro. A Sogra achava que os maridos deviam ter todo o conforto. Aparece por ali um vendedor de tecidos, que compra uma peça por três moedas de prata. A mulher faz-lhe um fato a contragosto, que lhe fica bem. No entanto, dias depois ele desapareceu.
Capítulo 5
            A Mãe aguardava a cada dia a vinda do Marido, até indicava às pessoas datas em que ele chegaria, e tentava justificar a sua não vinda com subterfúgios engenhosos. Ele nunca mais vinha e um dia ela foi à cidade vender uma palha de arroz, obtendo dinheiro com que mandou um letrado escrever uma carta para sua casa em nome dele, dizendo que estava bem e até lhe enviava uma cédula, que podia trocar por dinheiro, fugindo assim à vergonha de ter sido abandonada pelo marido.
Capítulo 6
            Foi recebida a carta, e a Mãe, que não sabia ler, chamou um letrado da terra a casa ler a carta, que os vizinhos ouviram com curiosidade, ficando até com inveja da sorte que ela tinha. A Mãe falou com eles satisfeita, com o júbilo de o marido não a ter abandonado. Tinha recebido uma cédula que podia ser trocada por dinheiro, e assim o fez, enterrando as moedas no chão do quintal. Os vizinhos sabendo que ela agora estava rica vieram logo pedir-lhe dinheiro, que ela se escusou, pensando que talvez tivesse falado demais.
Capítulo 7
            A Mãe na primavera pôs o filho mais velho a trabalhar, mas ele ainda não dava conta do recado. Tentou adestrar a filha cega nas lides da cozinha. Ela já sabia acender o lume, pôr as panelas na lareira e fazer algumas refeições. A Prima teve uma criança, e ela por essa altura sentiu mais a ausência do Marido. Chegou a casa cansada, o filho mais novo quis mamar e ela recusou dar-lhe a mama. A filha foi que foi pegar no irmão. E a parir desse dia ele nunca mais lhe pegou no seio.  

Capítulo 8
            A Mãe desde jovem que fora uma mulher paciente, trabalhadeira, obediente, mas de temperamento ardente, aceitando o mundo como se ele lhe tivesse sido assim destinado. O casamento surgiu como coisa natural, dava-se bem com o Marido, que era o pai dos seus filhos. O Filho mais velho era alto e silencioso, rijo no trabalho, mas a filha era fraca de vista. Era um desgosto para ela a sua doença. O Filho mais novo brincava alegre por casa. A Prima é que era uma mulher de sorte, tinha um marido honesto e trabalhador.

Capítulo 9
            A Mãe ainda não tinha esquecido o marido, que lhe fazia muita falta. Na primavera aparece o encarregado do rendeiro para lhe receber a renda, mas tem vergonha de pedir dinheiro a uma mulher. O Filho mais velho acha que ele devia ser um bom homem. Um dia ela vai à cidade para comprar um gancho de cabelo que se partiu, e aparece por lá um viúvo que lhe deu um gancho e uns brincos de prata. Ela depois de os ver não os quis aceitar, mas já não voltou a ver o homem. 
 
Capítulo 10
            Chegou a primavera e não apareceu ninguém reclamar a renda, embora ela não se voltasse a esquecer de quem a vinha cobrar. O arroz começava a ficar dourado nos canteiros. Ela tinha cultivado o campo de arroz com toda a mestria que sabia. Chegado o verão o agente do senhorio apareceu por lá para ver como ia a colheita. Ela foi mostrar-lhe prazerosa como ia o estado das culturas. Sentaram-se e conversaram animadamente. Ela já sabia o que ele vinha ali fazer, era um homem. 
Capítulo 11
            Uma noite veio frio, a sogra adoeceu, e pediu uma terceira mortalha vermelha, que seria a última. E por fim lá morreu triunfante. Para surpresa sua, a Mãe apareceu grávida. A situação era grave, chegou a pensar em enforcar-se. Mas fala com a Prima, que se mostrou compreensiva e lhe arranjou uma mistela para beber, com que abortou. O Filho mais velho quis ir à procura do pai, mas a Mãe convenceu-o de que ele já teria morrido. A Filha continuava por casa quase cega, embora a Mãe tivesse esperança que ela recuperasse.

Capítulo 12
            Mais tarde a Mãe vai à cidade ver se conseguia comprar um remédio para a cegueira da Filha, mas foi dissuadida por um farmacêutico, que disse que aquele mal não tinha cura. Ela então vai comprar-lhe um gonzo, com o qual podia fazer barulho na rua a anunciar a sua presença. Veio para casa e foi a um santuário pedir à deusa viva que curasse a Filha. Mas ela não melhorou e a Mãe ficou sem saber a vontade dos deuses, talvez o não ter sido atendida se devesse a uma expiação sua que era necessário fazer.

Capítulo 13
A Mãe fez agora quarenta e três anos. Os filhos achavam que ela estava a ficar velha, queriam-na fora dos campos, mas ela ainda se desembaraçava bem dos trabalhos de casa e na cultura do arroz. Por fim tornou-se a parteira da terra. Em casa reina algum mal-estar, os dois irmãos não se dão bem, o Filho mais novo só vinha a casa quando o irmão velho não estava. A Filha recebeu um novo gonzo e passou a saber andar pela rua. E em casa já trabalhava na cozinha, fazendo tudo como se visse.

Capítulo 14
            O Filho mais velho não se estava a dar com o mais novo e a Mãe achou que estava na hora de casá-lo. Mandou procurar-lhe uma mulher numa terra onde havia muitas mulheres, já que ali não as matavam à nascença. Fez-se uma cerimónia tradicional de casamento. A Nora era diferente dela, tinha gostos diferentes, mas o filho dava-lhe preferência. O Filho mais velho faz um quarto ao lado para o casal, e a mãe recupera o seu antigo quarto, já que com o casamento dele teve de ir para uma enxerga ao lado. A Filha cega quer também casar, mas quem a queria?

Capítulo 15
            O Filho mais velho queria que a irmã casasse. A mulher era respeitadora para a cunhada cega, mas reservava as melhores coisas para o marido e para ela. A Mãe, resistiu a que ela casasse, mas pensou que um dia que morresse ela ficaria sozinha, desprotegida, e resolver arranjar uma alcoviteira que lhe encontrasse um marido. Vem um velho buscá-la. Eles não gostam do seu aspeto, mas ele diz ser o tio do noivo. A mãe lá a deixa partir para o sopé de uma montanha, ficando em lágrimas.

Capítulo 16
            A Mãe sente a ausência da filha, e a Nora não lhe dá netos. O Filho mais novo vivia agora na cidade, trabalhava com livros e pensava em casar. Muito tempo depois a Mãe quis ir ver a Filha. A Nora não se importou desde que ela fosse com o Filho mais novo. Lá seguiu com ele num burro do Primo. Foi à sua procura por montes e vales, e quando chegou lá cima deu com a Filha morta, iam fazer-lhe o funeral. A pobre morrera de desgosto e de trabalhos forçados, pois o marido dela era um atrasado mental qualquer.

Capítulo 17
            A pobre Mãe vem embora de coração destroçado. Acha que eles a mataram de qualquer modo, embora não lhe notasse nódoas no corpo. Estaca magrinha como um esquife. Quer levar o caso à justiça, mas não tem dinheiro. Chegou a casa e chorou por ter deixado partir a Filha, e por a não ter trazido morta da serra. Discutiu com toda a gente, até com o Primo, que disse que ele era lento a pensar. Voltou-se então para o Filho mais novo.
Capítulo 18
A Mãe com a idade passou a esquecer-se das coisas, uma vez deixou cair uma criança do colo. Mas teve um gosto, O Filho mais novo que estava saído, voltou para casa. A saudosa imagem do Marido já não lhe surgia nítida à cabeça, e era o Filho mais novo que o fazia recordá-lo. Este, ao fim de alguns dias voltou a sair, o que a desgostou, mas o Filho mais velho disse que não ligasse ao caso, que se tratava de uma criancice dele. A Mãe estava preocupada com a Nora, pensando que ela era estéril. Nunca mais lhe dava um neto.
           
Capítulo 19
            Um dia o Filho mais novo veio ali a casa pedir à Mãe para ela lhe guardar um fardo debaixo da cama. E para a alegria ser mais completa a Nora apareceu grávida. Porém, nem por isso deixou de estar preocupada, ela podia ter uma criança doente, ou ter uma filha, que ainda seria pior. Uma coisa a estava a preocupar, o Filho mais novo nunca mais apareceu por casa buscar o fardo. Foi ver o que continha, e eram apenas livros. Por fim conseguiu saber do filho: estava preso às ordens do governador para ser condenado à morte, pertencia aos rebeldes comunistas. Ela foi buscar todo o dinheiro de prata que tinha para o Filho mais velho o tentar salvar. Ele ainda juntou algum do seu, mas tal não foi possível. No dia aprazado foi executado com os seus companheiros, que cantavam alegremente canções revolucionárias. A Mãe veio para casa completamente destroçada. Estava ali a chorar quando o Filho mais velho lhe veio dizer que a mulher tinha tido um filho homem. Ela sentiu-se de novo agraciado pelos deuses. Vê-se continuada naquele menino.


            – APRECIAÇÃO GERAL

Designado por A Mãe, este romance diz respeito a uma família chinesa de camponeses pobres, cujo Marido, não muito amigo de trabalhar. É um jogador libertino e abandona a mulher com dois filhos e uma filha, e a própria mãe, para ir tentar a vida noutro lugar. Ela aguenta sozinha o trabalho do campo e finge que ele está na cidade a trabalhar. Vai ter que gerir sem ele toda aquela família. O livro expressa com detalhe a maneira como viviam os camponeses pobres daquela terra, e dá uma ideia da forma desigual e diminuída de como a mulher é tratada na China rural, cujas crianças do sexo feminino são rejeitadas, e algumas mortas à nascença. Ainda que desempenhem um papel fulcral na família e na educação dos filhos, na cozinha, na confeção da roupa, no trabalho dos campos. Mas vêm ali novos tempos com a aparição do comunismo, que ainda vai afetar de um modo trágico aquela família.
            Pearl S. Buck usa uma linguagem muito simples, muito direta, como se nos estivesse a narrar um conto para crianças, é expressiva, genuína, captando o fundamental da alma chinesa, e o seu contraste com o da sociedade ocidental. As questões do amor e sexo são tratadas com grande subtileza. Mesmo usando uma linguagem coloquial consegue comover o leitor, que se apercebe daquele coração de mãe, cheio de amor, mesmo para o marido ingrato, para os dois filhos, que não se dão, para a filha que é cega, para quem procura garantir o futuro, e para a própria sogra que trata como mãe. O leitor pode ver bem a vida árdua daquela mulher, que se escraviza a trabalhar para a família, procurando com o senso comum chinês ir resolvendo os problemas que lhe vão surgindo, e sempre com uma grande dignidade, dir-se-ia mesmo, serenidade.
            A Mãe é um título de livro que nem é original, pois já aqui comentamos outro de Máximo Gorki. Mas há espaço aqui para todas as mães que têm o coração do tamanho do mundo. E esta versão de mãe tem dentro dela muito dessa força telúrica que mantém a vida sobre a Terra, o seu ventre é fecundo, os seus seios generosos, as suas mãos caritativas. São postas à prova três gerações para se ter uma ideia geral de como vive aquela sociedade, e se analisar a sua evolução. Esta obra, para além das virtudes de nos mostrar o Oriente, de nos alertar para a desigualdade da mulher, que não se verificava e verifica só na China, mas por toda a parte, dá-nos ainda uma visão bastante distanciada da realidade social chinesa para que, sem nos explicar como, nos possa fazer compreender como aquela sociedade era injusta, e de como em questões sociais, raciais e na descriminação sexual há necessidade de construirmos um mundo melhor. Trata-se de um livro comovente.

01/02/2019
Martz Inura











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