F. SCOTT FITZGERALD
ROMANCE
O Grande Catsby
RELÓGIO D´ÁGUA
Tradução de Ana Luísa Faria
O HOMEM
Francis Scott Key Fitzgerald nasceu a 24 de Setembro de 1896 no Minnesota,
e faleceu em 21 de Dezembro de 1940 em Hollywood, na Califórnia. Nascido no
seio de uma família irlandesa católica, frequentou a Universidade de Princeton,
mas não chegou a concluir o curso. De espírito aventureiro, alistou-se na
Primeira Guerra Mundial como voluntário. Desde a faculdade que era dado ao
alcoolismo, embora tenha feito esforços para deixar a bebida. Casou-se depois com
Zelda Sayre, também escritora, tinham uma relação apaixonada e difícil, e ela
acabou por ser internada num hospício por demência, o que o afectou
psicologicamente. Tenta seguir uma carreira publicitária, publicando em 1920, Este Lado do Paraíso, retratando uma
América que afinal não é tão paradisíaca como se pretende. Torna-se o porta-voz
de uma certa juventude americana saída da guerra, e um ídolo da “Geração
Perdida”, para a qual o “Sonho Americano” tinha falido. Em 1922 publica o conto
Tales of the Jazz Age e o romance Belos e Malditos, levando uma vida de
boémia. E há que mudar, em 1924 muda-se para França, onde continuou a escrever,
é dessa época O Grande Gatsby (1925),
que vende pouco. Leva ali uma vida desregrada, publicando em 1934 Terna é a Noite, que também não teve
grande saída. Tinha uma saúde débil, ainda novo contraiu tuberculose, e mais
tarde teve problemas cardíacos. Afectado pelo álcool e pela depressão, em 1936 tenta
duas vezes o suicídio. É aconselhado a ter uma vida mais regrada e em 1937
volta aos Estados Unidos, indo viver para Hollywood, onde incia uma carreira de
roteirista. Em 22 de Dezembro de 1941 foi assistir a uma estreia ao Teatro Pantages,
teve um pequeno desmaio e veio para casa. Aborrecido, pois quem o visse assim
ficaria com a impressão dele ter bebido, o que não era o caso. No dia seguinte
morria de ataque cardíaco, tinha 44 anos de idade.
A OBRA
F. Scott
Fitzgerald foi romancista, contista, roteirista e poeta. Dos seus numerosos contos
destaca-se Tales of Jazz Age (1922). Citemos
os seus romances: Este Lado do Paraíso
(1920), Belos e Malditos (1922), O Grande Gatsby (1925), Terna é a Noite (1934) e O Último Magnata (1940), publicado
postumamente.
O ROMANCE O Grande Gatsby
- PRINCIPAIS PERSONAGENS
Jay Gatsby
É o
herói do romance, um homem elegante que faz constar que é filho de gente
abastada e estudou em Oxford, tendo participado na Primeira Guerra Mundial, onde
foi condecorado. Ele quer dar de si uma ideia lisonjeira, evidenciar um grande status, ser dono de uma grande fortuna,
só para impressionar Daisy, o seu primeiro e grande amor. Mas ele teve uma
infância modesta, fugiu de casa, foi apoiado por um tal Cody, até se afirmar
nos negócios, que no livro não estão bem esclarecidos, mas que estarão ligados
às bebidas ilegais e aos títulos da bolsa. Apesar de tudo move-o sentimentos nobres, é disciplinado e trabalhador, tocado
pelo “Sonho Americano”, granjeando a estima e admiração de Nick Carraway. Ele é
afinal o Grande Gatsby.
Nick Carraway
É o
narrador do romance, um alter-ego de F. Scott Fitzgerald, humano e reflectido. Tem origem numa
família aristocrata. Depois de se formar em New Haven entra na Primeira Guerra
Mundial. Quando regressa acaba por entrar no negócio da bolsa e vai viver para
os arredores de Nova Iorque, para o West Egg em Long Island. Tem uma visão
abrangente do que seja a sociedade americana, é muito sensível aos seus
primitivos valores e crítico em relação às personagem com quem convive, ao
ponto de eleger Gatsby como o melhor de todos.
Daisy
É prima
em segundo grau de Nick, uma mulher bela e encantadora, com uns olhos
cintilantes, uma boca sensual e uma voz enternecedora. Na juventude espalhava à
sua volta uma auréola de encanto, os homens deambulavam em seu redor atraídos
pela sua formosura, a sua voz cheia de doçura, que sussurrava promessas de
paraísos a que lhes era difícil resistir. Gatsby foi um dos que se deixou encantar
por ela, e por quem estava apaixonado. Mas com o tempo tornou-se calculista, frívola,
casando com o abastado Tom Buchanan.
Tom Buchanan
Era o marido
de Daisy e amigo de Nick, de quem fora colega na universidade. Filho de gente
muito rica, era pródigo a gastar dinheiro e cioso do seu poder para moldar o
mundo à sua vontade. Era racista e machista, infiel à sua esposa, tinha um caso
com Myrthle, mas não admitia a infidelidade dela. Era também arrogante para os
mais fracos, desonesto nos seus contactos, e mesmo vingativo, quando incentivou
Wilson contra Gatsby.
Jordan Baker
Era uma
campeã de golfe amiga do casal Buchanan, que a empurrou para Nick. Frequentava
habitualmente as festas de Gatsby, era uma mulher independente que não gostava de sentir em
inferioridade perante homens inteligentes, não muito culta, que era desonesta
nos jogos. Ao fim disse a Nick já estar noiva de outro homem, mas isto poderia
ser só um pretexto para acabar aquela relação por não suportar a superioridade
intelectual de Nick.
George Wilson
É um
homem frouxo, todavia bem parecido, casado com Mutile que o trai com Tom
Buchanan. Trancou a mulher quando se sentiu traído mas ela conseguiu fugir,
morrendo atropelada em frente da sua casa. Deduziu erroneamente que Gatsby
seria oi amante dela, por ser o possuidor do carro amarelo que a acidentou, e
foi matá-lo, suicidando-se em seguida.
Mirthle
Era uma
mulher muito sensual, com cerca de 35 anos, casada com George Wilson, que se
enfastiou dele, tornando-se amante de Tom Buchanan. Depois de descoberta a sua
traição foi fechada em casa pelo marido, que tencionava levá-la dali para
sempre, mas ela conseguiu fugir e na pressa precipitou-se para o carro de
Gatsby que a atropelou.
- SINOPSE DO ROMANCE
Capitulo
I
O
romance começa por citar um pensamento do pai de Nick Carraway, o narrador, que
uma vez disse: «Sempre que te apetecer criticar alguém, lembra-te que nem toda a
gente deste mundo teve as mesmas vantagens que tu». No Verão de 1922 Nick alugou
uma casa no West Egg em Long Island, numa zona habitada por pessoas que tinham
conseguido fortunas recentes, os novos-ricos. Negoceia títulos na bolsa, mas tem
um nível de vida inferior ao dos seus vizinhos. Começa a falar de si e da sua
família do estado do Minnesota, e de uma misteriosa e intrigante da personagem
que vai dar o nome ao romance: Gatsby. Há um West Egg e um East Egg, havendo
entre estas duas regiões privilegiadas divisões classistas. A primeira, a de
Gatsby, é a dos self-made man, e a segunda, a das fortunas herdadas, dos ditos
aristocratas. Um dia vai visitar a sua prima Daisy, uma mulher bela mas
fugaz, casada com o ricaço Tom Buchanan, já seu conhecido, que tem por desonesto
e arrogante. Enquanto Tom fala com Nick, louvando um livro de feição racista, Daisy
conversa com a famosa Jordan Baker, uma jogadora de golfe que vai entrar num
torneio, para quem empurram Nick. Durante o jantar Tom recomenda um livro
racista, defensor da “supremacia branca”. Toca o telefone e Tom vai atender,
seguido pouco depois de Daisy, e é então que Jordan Baker comenta para ele que
Tom tem uma amante em Nova Iorque (afinal não são o casal bem arrumado que
pensava, apesar da riqueza há nuvens negras a assombrar aquele casamento). Ele
ouve-a com atenção, ela é uma mulher atraente, cheia de energia, mas sente-se
entediada, soube que num torneio não foi honesta e culturalmente parece-lhe débil
(a sua beleza e riqueza não combinam com o cinismo e a desonestidade da sua
personalidade). O capítulo termina com Nick a regressar a casa e a tentar
encontrar-se com Gatsby, uma pessoa de quem todos lhe falam, e do que ouviu
representa tudo o que mais despreza. A noite está límpida, com luar, mas ele
está afastado, e ainda não vai ser nessa noite que vai falar com ele (trata-se
de uma pessoa misteriosa e estranha, que apesar da sua riqueza tem algo a temer,
qualquer coisa de sinistro).
Capitulo
II
Tom
Buchanan leva Nick Carraway a fazer uma viagem de West Egg até Nova Iorque. Pelo
caminho passam pelo vale das cinzas, onde este último vai a casa de George
Wilson, casado com uma tal Myrthle, de quem é amante. (Este vale das cinzas na
realidade não existe, será para o autor simbolicamente representar uma zona da
cidade degradada, será uma zona industrial, subproduto do capitalismo, desolada
e pobre. E o mesmo se pode dizer do Dr. T. J. Eckleburg, com um nome enigmático
e olhar recôndito por trás de uns óculos escurecidos, que parece providenciar sobre
os destinos do mundo). Wilson é um marido frouxo com um pequeno negócio, e
Myrthle, uma esposa infiel. Ainda na casa de Wilson, Tom Buchanan tem uma
conversa arrogante para com este e leva a esposa Myrthle com Nick até Nova
Iorque para casa da sua irmã, Catherine, uma jovem de cabelo vermelho, muito
maquilhada, com um modo de vida suspeito. Já na cidade encontram-se com o casal
McKee com quem confraternizam. Catherine fala de Gatsby e tem dele uma versão
fantasiosa, pouco fundamentada, como para o autor lhe criar uma auréola de
mistério. Bebem demais, Nick está mesmo bêbado. Tom tinha acabado de comprar um
cão para Mythle, mas estão meio embriagados e desentendem-se, ela começa a
falar de Daisy e ele acha que ela não tem o direito de invocar o nome dela, mas
Myrthle insiste, repetindo o nome várias vezes. Tom enerva-se, e, valendo-se do
seu status social e da sua força física esmurra-lhe o nariz. A festa termina
abruptamente. (Esta passagem é reveladora dos vícios de classe e da má índole
de Tom Buchanan). E Nick segue para casa no comboio das quatro da manhã.
Capitulo
III
Da sua
casa Nick costumava aperceber-se das grandes festas que o seu vizinho Gatsby
dava às sextas-feiras, e ver o seu Rolls Royce transformar-se em autocarro para
ir à cidade, a orquestra a chegar pelas sete horas, os hóspedes a entrar, e
todo aquele espectáculo de luzes, de luxos e som com que a sua mansão se
iluminava. Até que um dia recebeu um inusitado convite para ir a essa festa, o
que fez com com Jordan Baker. Logo após entrar quer encontrar-se com o seu
anfitrião mas não o descobre, deparando-se com alguns hóspedes a fazerem as
mais incríveis conjecturas sobre ele. Há quem diga que ele não se mete em
problemas e quem diga que ele matou noutros tempos um homem, ou que fora um espião
durante a guerra (o mistério sobre esta personagem adensa-se). Lá dentro havia
sinais de luxo, riqueza e ostentação para deslumbrar os muitos hóspedes. É a
atmosfera da década de 20 na América, a realização do “Sonho Americano”, o
glamour, a subida de classe, a procura do refinamento das maneiras
(vislumbram-se aqui o Est Egg e o West Egg, os novos e os velhos ricos). Passa
pela biblioteca e encontra um convidado, o “Olhos de Coruja” a examinar um
exemplar dos livros, admirando-se por serem verdadeiros, pensava que deles houvesse só as lombadas, (para ele a vida de Gatsby tinha algo de teatral, suspeitava que vivesse sob o signo das aparências. Ao meio da noite Nick e
Jordan sentem-se numa mesa com um homem ainda jovem com quem metem conversa, e
ele é nada mais nada menos que Jay Gatsby. Ele começa a falar e as suas palavras
são serenas, o seu sorriso inspira confiança e optimismo, é tocada pela
vitalidade e pela crença, frequentou Oxford. Nick ficou agradavelmente surpreendido
com Gatsby. Não demorou que este recebesse uma chamada de Chicago, era um homem
muito procurado. Pelas duas horas da manhã, quando tudo já está bem bebido, o
mordomo vem dizer a Miss Jordan que o patrão deseja ter uma conversa a sós com
ela. Nick ficou intrigado, tanto mais que eles demoraram cerca de uma hora, e andou
por ali à volta, entrando na biblioteca. (Porém, para o autor as aparências por
vezes iludem, a percepção por vezes afasta-se da realidade). Gatsby convidou
Nick para dar com ele um voo de hidroavião na manhã seguinte. Nick e Jordan saem,
cá fora deparam-se com um pequeno acidente e um bêbado a tentar contar o
sucedido. O narrador pára aqui a história para a recordar mais tarde, e assim analisar
melhor este dia: Afinal estava a gostar mais da cidade de Nova Iorque, começava
a apreciar o prazer que lhe davam as suas noites, o vaivém das pessoas, os
teatros, aquele movimento incessante, embora nem tudo lhe agradasse nela. Seguindo
os conselhos de Tom e Daisy continuou a andar com Jordan Baker, ele achava-a um
tanto estouvada e desonesta, mas possuidora de uma tal beleza, de um tão
sorriso tão encantador que não era difícil gostar dela.
Capitulo
IV
Nick faz
uma listagem das pessoas que nesse Verão visitaram a mansão de Gatsby, umas diziam
que ele estava ligado ao contrabando de bebidas, outras ao assassinato de um sobrinho
de Von Hindenburg. Para as designar Fitzgerald utilizou nomes mirabolantes
ligados a árvores e animais, como bétula, furões, cabritos monteses, que só os
conhecedores da língua inglesa poderão apreciar o sentido. Um dia Gatsby
convida-o a ir almoçar consigo e vem buscá-lo de carro. Trata-o por “meu
velho”, como era costume. Seguem para Nova Iorque, acelerou na zona das cinzas
(para fugir da poluição e da miséria), quando ultrapassa os limites de
velocidade e a polícia o manda parar mostra um cartão branco e é mandado seguir
(por isto se pode analisar a corrupção existente). Faz de novo alguns
comentários entre o Leste e o Oeste. Já no restaurante Gatsby apresenta-lhe
Meyer Wolfshiem, que num intervalo diz que Gatsby pode ter uma fortuna
associada ao crime. Durante o jantar mostra uma medalha de Montenegro, com que foi
agraciado durante a guerra. A passagem dele pela Universidade de Oxford foi
curta, uns meses como prémio aos desmobilizados de guerra. Gatsby diz ser filho
de ricos, e dá uma versão de si próprio que não convence Nick totalmente (todos
se tentam encobrir atrás de aparências). Depois do almoço encontra-se com Jordan
Baker, que lhe fala do passado de Daisy e do seu casamento com Tom Buchanan, e
lhe desfaz o segredo da conversa que teve com Gatsby durante a festa. Afinal,
ele tem uma paixão por Daisy, vinda de quando era jovem e a amou em Louisville,
não prosseguindo o namoro por ser pobre. Quer que ele a convença a vir a sua
casa tomar um chá para ele fortuitamente se encontrar com ela. Receia que se
for ele a fazer o convite ela o rejeite liminarmente. Ele só comprou aquela
mansão para estar mais perto dela. (Atentemos que o objectivo dele, o seu
sonho, não é o dinheiro, tem a ver com uma paixão, tem uma conotação romântica,
não é materialista é individualista).
Capitulo
V
Quando
naquela noite Nick chegou a casa de táxi, olhou para a mansão de Gatsby e esta
parecia uma Feira das Indústrias, toda iluminada. Foi isso mesmo que lhe disse,
quando o viu ali à sua espera, ansioso por novidades. Queria saber quanto ao
seu encontro com Daisy. Nick confirmou-lhe que falara com Jordan Baker, e que
estava combinado um encontro para o dia seguinte na sua casa pelas quatro
horas. Gatsby quis pagar-lhe por estar a ter aquele encargo mas Nick recusou,
sentindo-se até ofendido por ele lhe fazer aquela proposta (naquela sociedade
tudo era pago, mesmo para se juntar dois amigos). No dia seguinte, um pouco
antes das quatro horas estavam os dois à espera dela. Cá fora chovia. Percebia-se
que Gatsby estava inquieto, receava que ela não viesse, mas à hora marcada lá
estava. Olhou para o relógio, achou que era tarde e queria ir-se embora (isto
dá ideia do seu nervosismo e da sua inabilidade em recuperar Daisy). E quando
Daisy entra em casa Gatsby desaparece. Isto intriga Nick, que não estava à
espera daquela reacção, tem que ir lá dentro chamá-lo, tanto ele como ela estão
constrangidos. Mas pouco depois ele bate à porta e entra no compartimento. Os
dois, ele e Daisy ficam um tanto perplexos, não sabem o que dizer um ao outro, Gatsby
pensou mesmo que aquela reunião terá sido um erro. Sobem para o primeiro andar.
Para acelerar as coisas Nick sai da sala e deixa-os lá ficar lá sozinhos, aí
uma meia hora. É uma pessoa tolerante, talvez se reencontrem, Tom anda com
Myrthle, há um certo relaxamento moral entre os ricos em Nova Iorque. Lá fora a
chuva parou e Gatsby convida Daisy e Nick para virem à sua mansão. Esta fica
surpreendida com o seu estilo de vida luxuoso e chora mesmo quando ele lhe mostra
uma colecção de camisas inglesas. Os olhos dos dois estão humedecidos de
felicidade. Está ali um hóspede, Klipspringer que toca “Is not We Got Fun?”,
que os enleia (a visão das camisas inglesas e esta canção têm uma função
nostálgica). Parece que aquela antiga relação se reacendeu. Estão tão felizes
que Nick não está ali a fazer nada e sai.
Capitulo
VI
Um repórter
de Nova Iorque aparece junto à porta da mansão de Gatsby para lhe fazer uma
entrevista, os hóspedes que a frequentam espalharam os mais estapafúrdios
boatos sobre a vida dele. Mas é Nick que vai falar de Gatsby, afastando-se das
versões dos hóspedes, bem como das que ele lhe revelara (ele naturalmente procurara
disfarçar a sua origem de classe). Gatsby nasceu no Dakota Norte com o nome de
James Gatz, tinha um trabalho humilde e chegou a ser pescador de salmão e
moluscos no Lago Superior. Um dia apercebeu-se da chegada de uma tempestade e
foi avisar Dan Cody, um magnata do cobre rico, do perigo que corria um iate que
ali tinha atracado. Agradecido pelo facto Cody contratou-o para os seus
serviços, valendo-lhe nas muitas bebedeiras que apanhava. Fez com ele uma
viagem às Índias Ocidentais, e quando morreu deixou-se 25000 dólares por
herança, testamento que a amante anulou. Porém este convívio estimulou-o a
entrar no mundo dos negócios e a vir a ter sucesso. Uns dias mais tarde Tom
aparece em casa de Gatsby com o casal Sloane depois de um aula de equitação,
Gatsby convida-os para o jantar mas eles recusam, então eles convidam-no por
cortesia para vir ele jantar como eles, e ele aceitou, não percebeu que aquele
era apenas um gesto refinado de educação burguesa, hipócrita. Entretanto demorou,
e o casal conseguiu desaparecer nos seus cavalos. (há aqui uma diferenciação de
classes entre os muitos ricos e os menos ricos, entre os velhos e os novos
ricos, entre o West Egg e o East Egg). Segue-se uma conversa desagradável entre
Gasby e Tom, que não está a gostar das visitas que Daisy lhe faz, embora ainda
não saiba que aos dois une uma relação intensa. No dia seguinte, sábado, Daisy
aceita o convite para uma festa em casa de Gatsby, que Tom só aceita para não a
desgostar. Já na festa há um mau encontro entre Daisy e Gasby, que fica muito
triste por verificar que a relação entre os dois estava perturbada. Numa
conversa entre Daisy e Tom, este diz que a riqueza do anfitrião está ligada ao
contrabando, ao que Daisy, irada, diz que está ligada a uma cadeia de
farmácias. Quando Daisy e Tom saem da festa Gatsby está desapontado com o
encontro que tiveram, ela estava repulsiva, não se divertiu, e vai desabafar
com Nick. Ele quer recuperar o amor de Daisy, e espera que o poder do seu
dinheiro consiga que ela deixe Tom Buchanan para vir viver com ele. Porém Nick
acha que ele não deve esperar demasiado dela, o passado pode-se não repetir
(ela não será mais a menina angelical que ele conhecera em Louisville, será
mais calculista).
Capitulo
VII
Gatsby
está obcecado por reconquistar o amor de Daisy, e para manter aquela relação
confidencial despede mesmo os seus empregados e admite um indivíduo obscuro ao
seu serviço, Meyer Wolfshiem. Numa tarde quente Nick vai a um almoço na casa de
Tom e Daisy, está lá também Jordan Baker e o filho de Daisy. Mas estão tão
aborrecidos com o calor que Daisy pede a Gatsby para irem para Nova Iorque. O
Dr. T. J. Eckleburg comenta para Nick que tanto Wilson como Tom andam a ser
traídos. Lá vão para a cidade mas em carros trocados (aqui Daisy parece pender
para Gatsby). Em Nova Iorque alugam uma suite no Hotel Plaza e desentendem-se.
Tom discute com Gatsby e diz que ele nunca esteve em Oxford, ao que aquele
afirma que esteve lá durante seis meses, com uma bolsa de estudos conseguida na
guerra. Tom estar a ficar com ciúmes e pergunta quais as suas intenções quanto
a Daisy, ao que ele responde que os dois têm uma paixão antiga, e que ela não o
ama (Tom não tem escrúpulos em ter Myrthle como amante, mas não admite a
infidelidade da esposa). Chateados resolvem regressar a Long Island. Tom Buchanan
deixa que Gatsby vá com Daisy para lhe provar que está seguro da sua fidelidade
(Tom sabe a maneira como a conquistou, tem trunfos que Gatsby talvez não tenha,
o amor deste pode estar morto, ele não lhe dará a segurança económica e social que
ela actualmente dispõe). De regresso a casa, Tom que segue com Jordan Baker e
os dois deparam-se com um acidente no vale das cinzas. Saem para ver e foi Mythle
que foi a atropelada, e pelo carro de Gatsby. Wilson está desesperado pela
morte da mulher e descobre que o veículo causador do acidente foi um carro
amarelo, que Tom diz ser do Gatsby. Ele tinha-a fechado em casa quando
descobriu que andava a ser traído, e ela foi atropelada quando fugia. De volta
vai à casa de Daisy, Nick verifica que ela e o marido parecem reconciliados,
estão a comer frango frito, e segue até à mansão de Gatsby, contudo, ele está
cá fora, tentando olhar para a casa de Daisy, à espera que ela lhe faça
qualquer sinal de luzes se as coisas correrem mal com o marido. Falam do
acidente, e da sua gravidade, Gatsby diz que o facto é lamentável, que era a
Daisy que ia a conduzir, mas que iria assumir a responsabilidade do acidente
para a furtar a aborrecimentos. (Aqui se prova que o amor de Gatsby é sincero,
tem raízes profundas). Ama-a em demasiado para reconhecer nela a sua frivolidade.
Nick ainda aí esteve algum tempo a falar com ele cá fora ao luar, como o fizera
quando se encontrara no primeiro capítulo. Mas já cansado regressou a casa para
tentar dormir.
Capitulo
VIII
Nick
foi para casa mas passou a noite em claro. De manhã vai visitar Gatsby, ele
esperou até às quatro horas da manhã, e como não ocorresse na casa de Daisy
qualquer coisa de extraordinário regressou à sua mansão. Nick aconselhou-o a
esquecer Daisy, mas ele mantém-se obstinado. Explica então como se cimentara o
seu amor por ela, quando Daisy deslumbrava pela sua beleza e juventude todos os
que a rodeavam, fora a sua pobreza e a guerra que os separara. Chegara ao posto
de major. (Na longa descrição deste amor dá para perceber que o móbil que o
levou a acumular aquela riqueza não foi o dinheiro em si, mas o amor a Daisy). O
jardineiro pretende esvaziar a piscina mas ele demove-o. Nick demorou-se ali
muito tempo a ouvi-lo, atrasa-se mesmo para ir para o trabalho, e quando se
afasta dele confessa-lhe que ele vale mais que todos os seus amigos (Nick
descobriu nele a genuinidade das suas intenções, a pureza do “Sonho Americano”,
para o qual todas as coisas são possíveis, se uma pessoa simplesmente se
esforça o suficiente). Nick vai para o trabalho mas deixou-se adormecer à
secretária, Jordan Baker ligou-lhe mas ele não lhe deu muita importância. Ligou
a Gatsby mas ele não atendeu. Foi então para casa e quando passou de comboio
pelo vale das cinzas pôs-se então a recordar o que se passou, quando no dia
anterior se deparou com o acidente. George Wilson balouçava de um alado para o
outro desesperado. Ao seu lado um tal Michaelis ia-o confortando. Ligaram para
Catherine, a sua irmã. Não dormiu durante toda a noite, durante o solilóquio com
Michaelis, ele disse que tiveram uma conversa com a esposa, e lhe dissera que ela
podia-o enganar, mas não a Deus. Aparece aqui o olhar do Dr. Eckleburg a
diabolizar esta ideia (este olhar simbólico como personifica a estupidez, a
crendice, a crueldade e a insensibilidade dos homens). Há nele uma forte
depressão, sede de vingança. São seis horas da manhã, Michaelis está exausto, Wilson
estava mais calmo e vai-se deitar. Passadas quatro horas vai de novo à garagem
de Wilson, mas ele já lá não estava, foram procurá-lo. O que deve ter
acontecido? Wilson pensa no carro de Tom Buchanan, mas exclui-o porque ele passou
noutra hora e o carro tinha outra cor. Segue então para a mansão de Gatsby, que
possuía o carro amarelo, está fora de si, não tem dúvidas, fora ele quem a
matara. Pelas duas horas Gatsby vai-se deitar sobre um colchão na piscina.
Ouvem-se tiros, Nick, o mordomo, o jardineiro e o motorista precipitam-se para lá,
vêem um círculo vermelho nas águas da piscina, de onde recolhem o corpo de
Gatsby, o de George Wilson dão com ele mais tarde (também para Gasby a vida sem
Daisy tinha perdido o sentido). Duas mortes estúpidas.
Capitulo
IX
Nick
Carraway pára o romance e deixa passar dois anos para continuar a história, com
isto deve ter querido reflectir sobre ela com maior distanciação. Depois da
morte de Gatsby veio a polícia, os repórteres, saíram as notícias mais
extravagantes. Ele organizou o funeral e não queria ir sozinho nele, mas para
seu espanto, ninguém queria vir, os tantos amigos que infestavam as suas festas
não estavam disponíveis. Daisy e Tom tinham desaparecido, porventura para fugir
àquela relação, telefonou a Meyer Wolfshiem e ele não estava, enviou-lhe uma
carta em mão pelo mordomo, e ele voltou com a resposta de que estava de rastos
mas não podia ir. Recebe um telefonema de Klipspringer, no qual ele se mostrou
muito pesaroso, ia fazer os possíveis para vir, mas tinha uma reunião agendada
para essa hora, e aproveitou para pedir que o mordomo tivesse a maçada de lhe
enviar uns sapatos que tinha ali deixado por esquecimento (as pessoas sempre
então dispostas a juntarem-se a quem lhes der qualquer coisa, e logo se afastam
quando elas estão em dificuldade: aqui se revelam as falsas amizades). Quem aparece
para o enterro é o pai de Gatsby, que soube da notícia pelos jornais, Henry C.
Gatz, por causa dele o funeral teve que ser atrasado. Vinha orgulhoso do filho, ainda com uma
fotografia dele e com um livro em que ele se propunha fazer o seu
auto-aperfeiçoamento. Deu-lhe uma carga de pancada quando ele uma vez disse que
“comia como um javardo”. Ao funeral foram apenas Nick, o pai de Gasby, o
mordomo, o “Olhos de Coruja” e alguns criados. Desencantado com os valores
morais de Leste, com sua frieza perante o ser humano, Nick pensa em voltar ao
Oeste. Desfez a sua relação com Jordan Baker, de quem não acreditava. Mais
tarde encontra Tom em Nova Iorque na Quinta Avenida e nem aceitou os seus
cumprimentos, ele induzira Wilson em erro, dizendo que fora Gatsby que atropelara
Myrthle e que era bem digno da morte, quando quem ia ao volante era Daisy. Mostrara-se
um pessoa insensível e irresponsável perante o seu semelhante, destruindo com o
seu egoísmo pessoas e coisas, a sua moral baseava-se no poder do dinheiro, que
usava para obter o que desejava, servindo ainda para minimizar os seus próprios
desaires. Nick lembra-se do Minnesota, do Centro Oeste, onde ainda há natal com
árvores verdadeiras, e os valores humanos não estão tão distorcidos, quer ir
para lá. Na sua última noite antes de partir para o Minnesota, Nick passa pela
mansão de Gatsby e apaga uma palavra obscena numa escadaria branca do edifício
(aqui se revela mais uma vez a sua simpatia por Gatsby). Enquanto se afasta
aquela zona foi escurecendo, e ele a reviu como ela seria quando aquelas terras
começaram a ser povoadas, com os colonos cheios de intrepidez, «com algo comensurável
com a sua capacidade de assombro» (há aqui uma confrontação entre os ideais do
Oeste que são bons, e os do Leste que são maus). Gatsby falhou o seu sonho mas
foi longe no seu esforço, Tom e Daisy, movidos por interesses mesquinhos
traíram as virtudes democráticas próprias dos americanos. E termina com estas
belas palavras, que estão na sua sepultura: «Assim vamos remando, barcos a
navegar contra a correnteza, incessantemente levados de volta ao passado».
COMENTÁRIO FINAL SOBRE O ROMANCE
A
análise deste romance foi sendo elaborada gradualmente no resumo por capítulos
que atrás se fez. Mas há que, numa apreciação final, tecer mais algumas
considerações sobre o seu conteúdo. E, antes de falar do seu aspecto meramente
literário, salientar a sua importância no domínio das ideias, pela crítica que
faz ao materialismo então efervescente, o qual, esquecendo-se dos valores
humanos, via o mundo sobretudo pela perspectiva do dinheiro; pela sua condenação
do indiferentismo moral dos mais ricos em relação aos mais pobres, os quais, insensíveis
aos valores humanos, ignoravam a desgraça alheia; pela maneira como denuncia o
egoísmo daquela sociedade, com cada indivíduo a olhar para o seu umbigo, ávido
de riqueza, de poder e de prestígio, preocupado sobretudo com as aparências,
com a ostentação, deixando à margem milhares de pessoas, como aquelas que
habitavam a zona de cinzas entre o West Egg e Nova Iorque, as periferias das
cidades para onde eram remetidos os menos aptos.
O
romance pretende explorar o sentido do “Sonho Americano”, que tem a sua génese
na Declaração da Independência dos
Estados Unidos da América, que proclamou que “todos os homens são criados
iguais, com direito à vida, à liberdade e à busca da felicidade”, que evoluiu
para a ideia mais pessoal, para a qual “todas as coisas seriam possíveis se uma
pessoa simplesmente se esforçasse o suficiente para as alcançar”. Mas este
livro de 1925 representa também a “Geração Perdida”, ou seja a geração afectada
pela Primeira Grande Guerra, a qual teve dificuldades em se integrar, nem
toda foi bafejada pela sorte, demonstrando que as circunstâncias ligadas ao
nascimento, à origem de classe, têm muito peso no futuro dos indivíduos, de como
o “Sonho Americano” estava a falhar, de como aquele progresso não se estendia a
todos, enviando para a marginalidade pessoas, que por mais que se esforçassem
viam sempre tolhidos os seus objectivos.
Formalmente
o romance é de pendor realista, faz crítica social e descreve a paixão, a miséria,
a ganância e a hipocrisia tal como a vê na sociedade. Utiliza uma escrita transparente,
directa e refinada. Introduz-lhe frequentemente focagens de matriz simbólica,
como quando fala daquela região de cinzas, habitadas por homens que trabalham
no meio daquela poeirada toda, e quando insere personagens ambíguas e medonhas
como o Dr. J. P. Eckleburg, em que a ignorância, a estupidez e a superstição
predominam, e ainda na onomástica, utilizando nomes e sobrenomes grotescos para
as personagens que lhes dão uma auréola muito própria. Estes pormenores de
linguagem, que dão densidade ao romance, infelizmente poderão não ser perceptíveis
numa tradução, mas já sabemos que as traduções são difíceis, e como é costume
dizer-se: as mais bem conseguidas não serão fiéis, e as mais fiéis não serão
bem conseguidas.
Este é um
livro que retrata bem a América do seu tempo, “Os loucos anos 20”. O mundo
depois da Primeira Grande Guerra tem necessidade de se reconstruir a partir das
rúinas, há um enorme progresso económico, com o rádio, o telégrafo e o telefone
a expandirem-se, o automóvel a democratizar-se e o avião a aparecer. Há uma
maior mobilidade das pessoas e das coisas, um ritmo de vida muito mais rápido e
alucinante; com a inovação económica a agigantar as empresas, trazendo a
pujança das bolsas e o aparecimento de grandes fortunas; bem como ainda com o desenvolvimento
social e cultural, com as mulheres a a usarem cabelos mais curtos e vestidos
mais ousados, a terem mais liberdade. Na música aparece o jazz, o charleston e
o foxtrot. Os teatros e os cinemas estão a abarrotar, há a promoção de grandes
espectáculos. Um maior espírito de aventura inspira os jovens, bem como um
maior entusiasmo pelos desportos – a tal fúria de viver. Repare-se que a obra
de F. Scott Fitzgerald só foi verdadeiramente reconhecida depois de 1950,
portanto depois da Segunda Guerra Mundial, na ressaca de uma outra guerra,
quando podia ser melhor compreendida, lembremo-nos por exemplo do aparecimento
do Rock e dos cabelos crescidos dos Beatles.
O Grande Gatsby é um livro que nos convida à moderação da
crítica, a reflectir e a apelar à tolerância, alertando-nos para a
responsabilidade moral que cada um deve assumir ao tomar qualquer atitude. É
cada um com os seus pequenos actos que pode tornar este mundo melhor. O livro
começa com um conselho do pai de Nick Carraway, que sempre o norteou,
alertando-o para a condescendência que lhe devem merecer aqueles que não
tiveram as mesmas vantagens que ele teve, apelando à compreensão mas também condenando
a desigualdade existente naquela sociedade, salientando «que as noções básicas
de decência são repartidas desigualmente à nascença». Para além da crítica que
faz à sociedade, representa ainda a tentativa, um convite a cada um à superação
de si mesmo para que atinja o sonho, o “Sonho Americano”. Por alguma razão é
considerado um dos melhores romances americanos do século XX. É um romance que
tem muito a ler nas entrelinhas, deveras interessante.
Martz Inura
2/6/2016
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