ALDOUS HUXLEY
Admirável Mundo
Novo
Edição Livros do Brasil
Tradução de Mário Henrique Leiria
O
Homem
Aldous Huxley nasceu em Godalming,
Inglaterra, em 26 de Julho de 1894, e faleceu em Los Angeles em 22 de Novembro
de 1963. Nascido numa família de intelectuais, foi obrigado a desistir do curso
de medicina aos 16 anos por um problema de visão, a qual recuperou mais tarde
para concluir um curso de letras. Viveu alguns anos na Itália fascista de Mussolini,
vendo de perto em progresso um sistema totalitário, e na Índia, onde recebeu
influências do Hinduísmo. Em 1937 mudou-se para Los Angeles, nos Estados
Unidos, e em 1838 para Hollywood, onde foi guionista de filmes como Madame Curie, Jane Eyre e Orgulho e
Preconceito. O problema da liberdade, da paz, da justiça e da fraternidade
preocupavam-no, dando origem a muitos dos seus ensaios. Afectado por um tumor
na laringe, e num estado avançado de cegueira, pediu à segunda esposa, Laura,
para o injectar com LSD, de que morreu.
A
Obra
A obra de Huxley é extensa e
diversificada, vai desde guiões para filmes, a contos, dramas, literatura
infantil, livros de viagens, ensaios, poesias e romances. Nela está patente os
seus vastos conhecimentos de medicina, psicologia, antropologia, filosofia. Inspirou
ao de leve a cultura hippy, os movimentos pacifistas, e de um modo mais notório
a literatura, a filosofia, a antropologia.
É bastante original, embora se tenha
a noção de que poderia fazer uma obra mais fundamentada, mais consistente, que
atingisse a plenitude de uma dimensão grandiosa que estaria ao seu alcance. Dos
romances destacaríamos Contraponto
(1928), Admirável Mundo Novo (1932), a
sua obra-prima, Sem Olhos em Gaza
(1931), A Ilha (1962); dos Ensaios, Filosofia Perene (1946), Os Demónios de Loudun (1944) e As Portas da Percepção (1954).
O
romance Admirável Mundo Novo
Afinal, que admirável mundo é este?
É um mundo em que os seres humanos
nascem a partir de provetas, portanto, in
vitro, seguindo processos de incubação, condicionamento e decantação da “moderna”
ciência, gerando seres Alfa, seres Beta, Gama, Delta, Épsilon, que podem ser
Mais, Médios ou Menos, conforme a sua ascendência perante os outros, ou até
Mais-Mais. A sociedade fica deste modo estruturada por castas, associadas a
cores, os Alfa são cinza, os Beta, amora, os Gama, verde, os Delta caqui, os
Épsilon, preto. Não existe religião, sendo a crença aqui reprovada, considerada
um acto de ignorância, Deus foi substituído por Ford ou Freud. O conceito de
família está ausente, já que a mesma não existe, por os pais e as mães não
serem necessários, já que os bebés são criados em laboratório – dar à luz é um
acto indecoroso. A ética moral tem aqui um sentido restrito, a vida sexual é
praticada desde os tenros anos, mas dentro do binómio "orgia-folia". Cada um
pertence a todos, estamos num estado social. Qualquer dúvida intelectual, qualquer
instabilidade psicológica será atalhada através de um processo químico, o “Soma”,
droga com que se condiciona a mente. Para impedir qualquer desvio social existe
um sofisticado Processo Bocanovsky, homogeneizando a população, permitindo de
um óvulo retirar 96 gémeos, e um Sistema “Hipnopédico”, que consistia em repetir
inúmeras vezes mensagens nas mentes das pessoas durante o sono, de modo a
ficarem cristalizadas no subconsciente, e assim, se garantir a Estabilidade Individual,
condição para que haja Estabilidade Social.
Personagens Principais
Tomakin, um Alfa, Director de Incubação e Condicionamento (D.I.C.). Bernard Marx, um Alfa-Mais,
especializado em "Hipnopédia". Henry
Foster, também Alfa, Administrador de Incubação e companheiro actual de Lenina Crowne, uma Beta-Mais,
vacinadora do Centro de Incubação e Condicionamento. Benito Hoover, amigo de
Lenina e desafecto a Bernard. Mustapha
Mond, um Alfa-Mais-Mais, Administrador Residente da Europa Ocidental. Helmholtz Watson, Alfa, professor de
engenharia, amigo de Bernard Marx, e de John,
o Selvagem, da "Reserva dos Selvagens", filho do Tomakin e de Linda, Beta-Menos, e Popé, também dessa reserva.
Breve sinopse do romance
Trata-se de uma obra de ficção
científica. O enredo não será o mais importante deste romance, composto de 18
capítulos, escrito por referência a muitas figuras proeminentes do passado,
como Henry Ford, Karl Marx, Freud, Shakespeare, Malthus, Darwin, Pavlov.
Inicia-se no edifício onde estão as intrigantes Salas de Incubação, Fecundação
e Decantação, com uma conversa científica entre o Director de Incubação e
Condicionamento (D.I.C.), chamado Tomakin, e Henry Foster, ali administrador.
Bernard Marx, Alfa-Mais, psicólogo, companheiro
de Lenina e responsável pela “Hipnopédia”, é um espírito curioso, quer saber
mais sobre a vida e pede ao D.I.C. para visitar a “Reserva dos Selvagens”, os
indígenas que ficaram fora daquele “admirável mundo”, a viveram a civilização
primitiva, equivalente à nossa. Ali descobre John, O Selvagem e a sua mãe,
Linda, originária do “admirável mundo”, que consegue trazer para a civilização,
a fim de os mostrar à sociedade e deste modo obter algum prestígio.
Na civilização, Lenina Crowne apaixona-se
por John, o Selvagem, que até está a gostar daquele mundo, mas recusa-se a ser
apresentado por Bernard Marx como urso de feira à sociedade. Sua mãe, Linda, oriunda
da civilização, mas privada dos benefícios daquela sociedade, perdeu longevidade,
está velha e gorda. Toma agora “Soma” mas a sua esperança de vida está
encurtada. É bem instalada numa ala do edifício, onde vegeta.
Bernard Marx quer levar Jonh, o Selvagem
ao conhecimento da sociedade, e toda a Londres arde de curiosidade para o ver. Isto
desagrada ao D.I.C., que, alguma razão terá para isso, e, pretendendo-se o
guardião de toda a ortodoxia, quer desterrá-lo para a Islândia. Contudo, Bernard
Marx já sabe do seu segredo, e denuncia-o perante a sociedade, acusando-o de
ser pai de John, o Selvagem. Perante este facto, ali considerado indecoroso, o
D.I.C, Tomakin, demite-se.
Linda, a mãe de John, o Selvagem, em
degenerescência, acaba por morrer no Hospital dos Moribundos, e ele revolta-se
com aquela situação, atraindo em seu socorro Bernard Marx e Helmholtz Watson,
que acabam por ser levados a Sua Forderia, Mustapha Mond. Ali são esclarecidos sobre
o mundo em que vivem, sendo-lhes explicado que a liberdade é perigosa, não traz
felicidade, e a ciência, desde a Guerra dos Nove Anos, e para bem do Estado, impôs
aquele sistema de Estabilidade Social.
Ficaram a saber demais. As pessoas
ali vivem numa ignorância salutar, que é preciso preservar em benefício do todo
social – são regidos por estes princípios. Vão ter que abandonar a civilização.
Dos três, cada um escolhe o seu destino, John, o Selvagem prefere ir viver para
um velho farol, onde vai ser perseguido por um repórter do Rádio Horário, que quer
fazer um filme sobre a sua vida. Inicialmente rejeitado, quer pela civilização
dita primitiva, quer pela moderna, é agora muito procurado e famoso, porém,
contrafeito entre aqueles dois mundos, é descoberto enforcado no fecho da
abóbada do farol em que vivia.
Algumas Conclusões
Não é um livro que se destaque pelas
suas personagens fortes, por um enredo intrincado e absorvente, o que na
verdade distingue este livro, o que o super-valoriza é o engenho com que nos
cria um mundo futuro, estruturado por ideias emergentes do presente, que olha a
humanidade actual com desprezo, mesmo repugnância, considerando-se a si mesmo evoluído,
o expoente da civilização mais avançada e pura, quando, na verdade, gerou no
seu seio um arremedo de humanidade, onde a liberdade foi coarctada, reina a
intolerância e a massificação, o ser humano foi esvaziado na sua identidade.
Sendo que não devemos ter medo do
futuro, cristalizarmos no passado, fugirmos da ideia de que o melhor está para
vir, também não nos podemos deixar iludir por panaceias de um novo mundo
falsamente empolgante, totalitário, com as mentes condicionadas
psicologicamente através da propaganda rotineira, por uma educação dogmática
uniformizadora, pela perversa manipulação do subconsciente através da tal “Hipnopédia”,
por uma crítica social castradora, feroz e intolerante, pela manipulação
química através do tal “Soma”, por viciosas lavagens ao cérebro, a serem
ministradas aos indivíduos com comportamentos desviantes.
Este livro, escrito em 1931, imagindo-nos um mundo de 2540 d. C., está condenado a ser profético, com o Estado a apropriar-se das mentes dos jovens, a reescever a História segundo a ideologia, com os embriões e a procriação em vítreo, a manipulação genética e a criação de super-homens e super-mulheres, as drogas para tudo. Ele vem-nos
alertar contra um progresso, que pode ser enganador; contra a preponderância do factor económico
na condução da vida, materialista e tirânico; contra o endeusamento da ciência
e da técnica, arvoradas com a bandeira de uma felicidade mecânica, de uma paz
social informe, que aprisionem o ser humano numa gaiola dourada de estabilidade
psicológica, e o transforme numa entidade artificial, falha de consciência, no
fundo desumana. Estes são os aspectos que tornam o romance Admirável Mundo Novo como um dos livros mais marcantes do século
XX.
22 de Abril de
2015
Nenhum comentário:
Postar um comentário